No momento, pouco importavam as amarras do pai, do marido. Agora quem prendia era o Estado – direito previsto por lei: tortura, assassinato, perseguição. Amarras nos corpos e nos cérebros.
Para as mulheres? Garantias especiais para pessoas especiais! Além das torturas clichês, também tínhamos direito à estupros! Incluindo brinquedinhos e coletividade (em alguns lugares, também entre os militares havia espírito
Porém, a repressão democrática no país, trouxe também a democracia na luta. Nenhuma mulher esperaria seu homem voltar da panfletagem, da reunião escondida ou da negociação das armas. Ninguém mais poderia esconder a participação das mulheres na história. Na ditadura militar brasileira, não como homens, mais como human@s que tod@s somos, as mulheres pegaram em panfletos, pegaram em armas, gritaram nas passeatas. As mulheres lutaram! Pelo direito à liberdade, que dessa vez pode ser, institucionalmente, arrancado pelo Estado.
Se nunca fomos donas de nosso próprio corpo, de nossa própria voz, agora nem o cérebro e a mémória eram nossos...
Por fim, podemos falar, narrar ou imaginar como foi viver num período onde a distribuição de felicidade acompanhava o Índice de Gini. Mas falar, narrar ou imaginar, não é sentir. Não é sofrer até hoje. Não é estar desaparecid@ até hoje.
Esse texto foi inspirado no cotidiano de nossa sociedade machista e, sobretudo, no filme/documentário de 1989, dirigido por Lúcia Murat, “Que Bom Te Ver Viva”² que mostra, numa mistura de realidade e ficção, a vida das mulheres que lutaram por liberdade na Ditadura Militar do Brasil. Depoimentos ricos, chocantes. Que nos deprimem pelo que fizeram de nós no passado, e pelo que fazem e fazemos de nós hoje (pois, se acaba a ditadura militar, ainda temos, no mínimo, a da beleza!)
Mas também, “quem é que trepa com a Joana D'arc, né?”³
Bem vind@s ao Cartas de Lamarca!
¹De “Nada causa mais horror a ordem, do que as mulheres que lutam e sonham”, José Marti.
²Para baixar o filme, acesse:
http://www.almascorsarias.com.br/2010/09/que-bom-te-ver-viva-1989.html
³Frase retirada do filme.
Por Mandi / Amanda Benedetti